Depois de um
ano fazendo diálise peritoneal em casa, os médicos decidiram que era melhor eu
fazer hemodiálise. Disseram que meu peritônio estava fraco por causa das
peritonites que tive. A diálise já não tinha o efeito esperado.
Fiquei com
medo, por causa das duas experiências ruins que tive na hemodiálise.
No ano 2000, o
Hospital São Paulo fundou a primeira casinha de hemodiálise pediátrica, e eu
fiz parte da 1ª turma.
Comecei a
fazer hemo em maio de 2000. Acabei achando melhor que a diálise peritoneal,
apesar de ter que ir à “casinha” 3 vezes na semana, (terça, quinta e sábado) a
sessão era de 4 horas (bem melhor do que ter que passar a noite ou ficar com o
líquido dialítico por 6 horas na cavidade peritoneal). Também tinha a questão
da dieta... Na hemodiálise eu podia comer comida com sal. Não tinha mais que
fazer comida separada pra mim. Mas, a restrição hídrica era a mesma; 500 ml por
dia. Ô sufoco!
De vez em
quando, eu abusava e pegava mais peso do que de costume. Era muito difícil
conseguir passar o dia com 500 ml de líquido, entre água, café, leite, suco,
frutas... Imaginem no calor! As enfermeiras mandavam chupar gelo para matar a
sede. Também tinha que seguir dieta de potássio, fósforo e proteína. E apesar de
tudo, eu estava entre os que pegavam menos peso entre uma sessão e outra. Eu
fazia um pouquinho de xixi, mas era quase nada, acho que 50 ml por dia.
Desde que
morava em Cananéia, de vez em quando eu “abusava” escondida. Às vezes, tinha
ajuda de “cúmplices” ... Minha bisa, a Bruna, minha prima Thathí... Quando eu
era pega, sempre sozinha, tomava aquela surra! Aquele ditado que diz: “O
proibido é mais gostoso”. É a mais pura verdade!
Depois de uns
dois meses fazendo hemo, marcaram pra eu tirar o cateter de Tenckhoff. Por três
vezes não deu certo porque os exames pré-operatório deram alterações. Na quarta
vez, estava tudo bem com os exames. Fui junto com uma menina, Kelly, que fazia
hemodiálise junto comigo, ela era deficiente visual. Resolveram tirar primeiro
o cateter dela. Voltei pra casa novamente sem tirar o cateter. A Kelly passou
mal na cirurgia e foi internada na UTI. Dias depois ela faleceu.
Disseram que
foi por causa da anestesia.
Foi aí que
percebi que, toda cirurgia, por menor que seja, é um grande risco.
Principalmente se for com anestesia geral.
Quando
finalmente consegui tirar o cateter, foi um alivio tão grande! Pensem na
alegria quando eu fui pra praia e pude entrar na água de corpo inteiro...
Aos 13 anos,
comecei a ter vergonha do meu corpo. Eu era muito magra e meus joelhos eram
valgos (pra dentro). Não conseguia engordar por causa do tratamento. Foram
muitas as vezes que me senti inferior as minhas primas, amigas, colegas... por
causa disso. Eu nunca ia em passeios para parques aquáticos, não usava shorts e
saia acima dos joelhos, nem calça apertada. Eu usei muito, calça de homem.
Nessa época,
ano 2000, eu estava na 5ª série, na E.E.Tito Prates da Fonseca. Precisei mudar
de escola porque o horário da outra entrava em conflito com o horário da hemodiálise.
Muitas vezes,
eu passava mal durante as sessões de hemodiálise. A pressão caia, a cabeça
doía, sentia falta de ar e vomitava. O pior, era sair da hemo e ter que ir
direto pra escola, de ônibus, porque nessa época minha mãe ainda não dirigia. Muitas
vezes eu não consegui ficar na escola por causa da dor de cabeça. Algumas vezes
insisti... Porém, na maioria das vezes não consegui ficar até o final e, minha
mãe tinha que ir me buscar.
Às vezes,
durante as sessões de hemodiálise as enfermeiras nos colocavam no centro da
sala para jogarmos baralho ou fazermos outra coisa... Também escutávamos
músicas. E, a cada quinze dias, voluntárias levavam animais para brincarmos.
Fazia parte de um tipo de terapia. Fora isso, nós dormíamos. A hemo era na
parte da manhã... Tinha que chegar antes das 7h.
Eu sempre fui
tratada muito bem no HSP. Achava o setor de nefrologia pediátrica ótimo! Fazia
acompanhamento nutricional, psicológico e odontológico. O odontológico era pago
pelo ICRIM (Instituto de Apoio à Criança e ao Adolescente com Doença Renal).
O ICRIM
promovia festas, passeios e dava presentes bons para “suas” crianças e
adolescentes. Tudo para amenizar o nosso sofrimento.
Na “casinha”
da hemo também, conheci pessoas maravilhosas e reencontrei outras. Apesar de
gostar de toda a equipe de enfermagem, médicos e demais funcionários, não posso
deixar de falar com um carinho muito especial (fico até emocionada) da “tia
Vanessinha”, há conheci quando ela fez estágio na “casinha” de diálise
peritoneal, depois ela fez estágio na casinha da hemo, e voltou formada para
ser enfermeira na “casinha” de hemodiálise. Ela é uma pessoa muito doce,
carinhosa e preocupada com seus pacientes. Até me visitava quando eu internava.
Uma vez, minha
mãe teve uma reação alérgica muito forte a dipirona e ficou internada no HSP. A
“tia Vanessinha” e a Dra. Malu (médica que dava plantão na casinha da hemo nas
terças-feiras) à visitavam e conversavam com os médicos para nos informar
melhor sobre o estado de saúde dela.
Quando saí da
hemo, fiquei uns 8 anos sem notícias da “tia Vanessinha”. Mas, querendo muito
encontrá-la. Soube, através de uma amiga do tempo da hemo, que ela havia mudado
para o México. Procurei muito na internet... Até encontrá-la! Hoje mantemos
contato.
Durante uma sessão de hemodiálise
(carnaval de 2001)